Santana Lopes decretou dois dias de luto nacional por causa da morte da Irmã Lúcia, em pleno período de campanha eleitoral. Alguns críticos da decisão têm invocado que deve prevalecer a separação entre o Estado e a Igreja. É um argumento sólido e racional, tanto mais que a morte da vidente de Fátima parece não ter gerado uma comoção generalizada.
O que já não é tão aceitável é o julgamento sumário dos líderes partidários, que decidiram interromper ou alterar os respectivos programas de campanha eleitoral. D. Manuel Martins, uma das vozes mais respeitadas e inconformadas da Igreja portuguesa, devia ter mais cuidado quando acusa os políticos de oportunismo político. A pressa em atirar uma pedra aos políticos deixa muito a desejar de uma autoridade da Igreja, cuja caridade devia começar por casa. E, nesta matéria, há tanto a fazer pela Igreja nos tempos que correm. Felizmente, D. Januário Torgal, apesar de alinhar na tese do pecado da oportunidade política, é mais moderado, pois critica os dirigentes políticos ainda que assegurando que não pretende julgar ou condenar ninguém.
A decisão de Santana Lopes está sujeita a todo o tipo de interpretações, umas legítimas outras bem enviesadas. A mais retorcida, talvez a mais hilariante, é a da vantagem política e eleitoral. Não faltam iluminados que insinuam que a decisão foi tomada porque favorece eleitoralmente quem a tomou. Assim, e para que fique claro, os defensores desta tese sustentam, mais ou menos sibilinamente, que Santana Lopes e Paulo Portas, sem esquecer José Sócrates, entre outros, decidiram suspender ou alterar as campanhas com o objectivo de obterem mais votos nas próximas eleições de dia 20.
Um raciocínio tão rápido e tão inteligente, de quem não apresenta uma única justificação do que está a dizer, tem o mérito de impressionar. É obra! Mas vale o que vale, apenas um punhado de sound bytes.
Dito isto, o mais extraordinário é que, para já, ninguém teve a honestidade intelectual de denunciar a consequência lógica do argumento de aproveitamento político: o perigo dos resultados eleitorais serem desvirtuados por uma decisão de Estado, alheia ao processo de esclarecimento dos portugueses. A razão é simples. Obviamente, ainda há a noção do ridículo e algum pudor em chamar estúpidos aos portugueses.
É legítimo opinar, com total liberdade, mas é preciso manter a objectividade, a coerência e a credibilidade. Ou será que vale tudo para alcançar outras reacções, essas sim com o intuito de influenciar o voto dos portugueses?
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